RECURSO – Documento:7072802 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Apelação Nº 5020701-57.2024.8.24.0018/SC DESPACHO/DECISÃO J. M. B. propôs "Ação de Rescisão Contratual c/c Danos Morais e Materiais" perante o Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Chapecó, contra CHAPECO CLINICA ODONTOLOGICA LTDA. Forte no princípio da celeridade e utilizando das ferramentas informatizadas, adota-se o relatório da sentença recorrida, por sintetizar o conteúdo dos autos (evento 23), in verbis: Trata-se de autodenominada "Ação de Rescisão Contratual c/c Danos Morais e Materiais" ajuizada por J. M. B. em face de CHAPECO CLINICA ODONTOLOGICA LTDA.
(TJSC; Processo nº 5020701-57.2024.8.24.0018; Recurso: recurso; Relator: ; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)
Texto completo da decisão
Documento:7072802 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Apelação Nº 5020701-57.2024.8.24.0018/SC
DESPACHO/DECISÃO
J. M. B. propôs "Ação de Rescisão Contratual c/c Danos Morais e Materiais" perante o Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Chapecó, contra CHAPECO CLINICA ODONTOLOGICA LTDA.
Forte no princípio da celeridade e utilizando das ferramentas informatizadas, adota-se o relatório da sentença recorrida, por sintetizar o conteúdo dos autos (evento 23), in verbis:
Trata-se de autodenominada "Ação de Rescisão Contratual c/c Danos Morais e Materiais" ajuizada por J. M. B. em face de CHAPECO CLINICA ODONTOLOGICA LTDA.
Aduz a parte autora que houve descumprimento contratual por parte da ré. Disse que m junho/2023, contratou tratamento de implantes e próteses dentárias por R$ 5.600,00, com entrada de R$ 2.000,00 e saldo parcelado em 16x de R$ 240,00. O tratamento iniciou em julho/2023, mas até março/2024 não foi concluído, apesar de a autora ter pago o importe de 80% do valor contratual. Narra que a moldagem das próteses falhou por três vezes, sem solução pela ré. Relata sofrimento físico e emocional, agravado pela negligência e descaso da clínica. Requereu rescisão contratual e restituição dos valores pagos, além de indenização por danos morais de R$ 10.000,00 e materiais de R$ 3.680,00, com juros e correção desde julho/2023. Fundamenta a demanda no CDC e no Código Civil, alegando obrigação de resultado e responsabilidade objetiva do profissional. Pleiteia também justiça gratuita e inversão do ônus da prova.
Após a complementação de documentos, foi deferido o benefício da justiça gratuita à autora e determinou-se a citação da parte ré (evento 9).
Citada (evento 15), a requerida deixou transcorrer in albis o prazo para ofertar contestação (evento 16).
Na sequência, a parte autora requereu a decretação de revelia e o julgamento da demanda (evento 20).
Do dispositivo da sentença, extrai-se o seguinte comando:
Ante o exposto, resolvo o mérito com fundamento no art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTE em parte os pedidos autorais para:
a) DECLARAR a rescisão do contrato de prestação de serviços odontológicos firmado entre as partes, por inadimplemento parcial da obrigação contratada, nos termos do art. 475 do Código Civil;
b) CONDENAR a parte ré CHAPECO CLINICA ODONTOLOGICA LTDA ao pagamento de R$ 1.570,00 (um mil quinhentos e setenta reais), a título de danos materiais, cujo importe deverá ser corrigido pelos índices oficiais1 - INPC de até 29/08/2024 e IPCA a partir de 30/08/2024 - a partir de cada desembolso (11/07/2023 - evento 1/5), e acrescido de juros de mora, percentual de 1% a.m. até 29/08/2024 e segundo a variação da taxa legal a partir de 30/08/2024, nos termos do artigo 406 do CC, com redação dada pela Lei n. 14.905/24, a contar da citação;
c) CONDENAR a parte ré CHAPECO CLINICA ODONTOLOGICA LTDA ao pagamento de R$ 7.000,00 (sete mil reais), a título de indenização por danos morais, cujo importe deverá ser corrigido pelos índices oficiais - INPC de até 29/08/2024 e IPCA a partir de 30/08/2024 - a partir da data da presente sentença, e acrescido de juros de mora, percentual de 1% a.m. até 29/08/2024 e segundo a variação da taxa legal a partir de 30/08/2024, nos termos do artigo 406 do CC, com redação dada pela Lei n. 14.905/24, a partir do evento danoso (09/02/2024 – evento 1/10, p. 6), momento em que a autora notificou extrajudicialmente a ré sobre a rescisão;
Diante da sucumbência recíproca condeno as partes, na proporção de 80% o réu e 20% a parte autora, ao pagamento das despesas processuais. Com relação à autora, observe-se a suspensão da exigibilidade, em razão da gratuidade de justiça.
Diante da revelia, condeno apenas a ré no pagamento de honorários advocatícios de sucumbência, os quais arbitro em 12% sobre o valor da condenação ao patrono da parte autora, na forma do art. 85, § 2º, do CPC, não descurando a natureza repetitiva e baixa complexidade da causa e os trabalhos desenvolvidos (revelia).
Irresignado, o RÉU interpôs o presente apelo (evento 35).
Nas suas razões recursais, sustentou, em síntese, que a sentença merece reforma. Quanto ao dano material, argumentou que o valor total contratado foi de R$ 5.600,00 (cinco mil e seiscentos reais), mas a autora adimpliu apenas R$ 3.140,00 (três mil cento e quarenta reais). Alegou que a parte mais cara e importante do procedimento, a cirurgia de instalação dos implantes, foi devidamente realizada e os implantes permanecem com a apelada. Ponderou que o laudo e a própria sentença reconheceram que os implantes foram instalados e apresentavam aspecto de normalidade. Defendeu que, diante do pagamento parcial e da conclusão da etapa cirúrgica, a clínica ficou em prejuízo, não havendo que se falar em restituição de valores. No que tange ao dano moral, aduziu que a condenação em R$ 7.000,00 (sete mil reais) é desproporcional e desarrazoada. Asseverou que não houve comprovação de qualquer prejuízo ou violação aos direitos da apelada, sendo a situação um mero descumprimento contratual. Fundamentou que a autora teria abandonado o tratamento de forma unilateral e não demonstrou ter sido exposta a situação vexatória que configurasse o abalo moral. Suscitou que a falha na prestação do serviço, por si só, não gera dano moral in re ipsa (presumido) e que a apelada não produziu provas do abalo emocional sofrido. Alternativamente, caso mantida a condenação, pleiteou a redução do valor indenizatório, por considerá-lo excessivo. Ao final, requereu o provimento do apelo para reformar a sentença, julgando improcedentes os pedidos de indenização por danos materiais e morais, ou, subsidiariamente, a minoração do valor fixado para os danos morais.
Contrarrazões no evento 41, da origem.
É o necessário relatório.
Decido monocraticamente, amparada no art. 932, III e VIII, do Código de Processo Civil e no art. 132, do Regimento Interno do , uma vez que a matéria em apreço está pacificada em precedentes desta 7ª Câmara de Direito Civil.
Sobre os poderes do relator transcrevo as lições de Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart e Daniel Mitidiero:
O relator tem poderes para dirigir o processo (arts. 932, I, VII e VIII, 933 e 938, CPC), para decidir questões incidentais (art. 932, II e VI, CPC) e para decidir o próprio recurso em determinadas situações (art. 932, III, IV e V, CPC). Nesse último caso, trata-se de expediente que visa a abreviar o julgamento de recursos inadmissíveis, compatibilizar as decisões judiciais e racionalizar a atividade judiciária. A Constituição não determina o juiz natural recursal. O Código de Processo Civil, no entanto, define o juiz natural recursal como sendo o órgão colegiado do tribunal a que compete o conhecimento do recurso. Nesse sentido, o relator, alçando mão do art. 932, CPC, apenas representa o órgão fracionário - a possibilidade de decisão monocrática representa simples delegação de poder do colegiado ao relator. O relator tem o dever de julgar o recurso monocraticamente, preenchidos os requisitos inerentes à espécie, porque aí estará prestigiando a autoridade precedente (arts. 926 e 927, CPC) e patrocinando sensível economia processual. [...]. O relator deve exercer seus poderes de ofício, independentemente de requerimento de quaisquer das partes (Novo código de processo civil Comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 997 - grifei).
Preenchidos os requisitos extrínsecos e intrínsecos de admissibilidade, o recurso merece ser conhecido.
Mérito
A controvérsia cinge-se à verificação da responsabilidade civil da clínica odontológica apelante por falha na prestação de seus serviços, bem como à adequação da rescisão contratual e das indenizações por danos materiais e morais fixadas na sentença.
De início, é incontroverso que a relação jurídica estabelecida entre as partes é de consumo, enquadrando-se a autora no conceito de consumidora (art. 2º do Código de Defesa do Consumidor - CDC) e a ré no de fornecedora de serviços (art. 3º do mesmo diploma).
Em se tratando de prestação de serviços odontológicos, a responsabilidade civil do fornecedor é, em regra, objetiva, nos termos do art. 14 do CDC. Isso significa que o dever de indenizar independe da comprovação de culpa, bastando a demonstração da conduta, do dano e do nexo de causalidade entre eles. O referido dispositivo legal preceitua:
Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
O fornecedor somente se eximirá de sua responsabilidade se provar uma das causas excludentes previstas no § 3º do mesmo artigo: que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste; ou a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
O ônus de tal prova, por força do deferimento da inversão probatória no despacho saneador (evento 9), recai sobre a ré/apelante.
No caso concreto, especialmente em se tratando de procedimentos de implantodontia e confecção de próteses, a obrigação assumida pelo profissional é, predominantemente, de resultado. Não se espera do profissional apenas a diligência e o emprego da técnica adequada (obrigação de meio), mas a efetiva conclusão do tratamento com a colocação de próteses funcionais e esteticamente adequadas, que era o fim almejado pela autora ao celebrar o contrato.
Feitas essas considerações, passa-se à análise pormenorizada das teses recursais.
A apelante argumenta que não deve restituir valores a título de danos materiais, pois teria executado a parte mais onerosa do tratamento — a instalação dos implantes cirúrgicos — e que a autora teria adimplido valor inferior ao total contratado.
A tese não prospera.
O substrato probatório carreado aos autos, somado à revelia da ré, corrobora de forma inequívoca a falha na prestação do serviço. O contrato firmado entre as partes (evento 1, documento 8) tinha como objeto um tratamento de implante e próteses dentárias, com valor total de R$ 5.600,00 (cinco mil e seiscentos reais). A autora comprovou o pagamento de, ao menos, R$ 3.140,00 (três mil cento e quarenta reais), conforme nota fiscal anexada (evento 1, documento 5).
O tratamento foi contratado em junho/2023, com a promessa, segundo a exordial, de finalização em até seis meses. Contudo, o que se observa é uma sucessão de falhas e atrasos. O prontuário da paciente, fornecido pela própria clínica (evento 1, documento 6), é um documento crucial, pois contém a seguinte anotação manuscrita pela equipe da ré:
"prótese não tem adaptações. Pela 3 vez fizemos, mas a ponte protética não tem adaptação, paciente não quer mais o trabalho".
Esta anotação constitui uma confissão da falha técnica na confecção das próteses.
A apelante, por três vezes, tentou realizar a moldagem e adaptação da peça protética, sem sucesso. O serviço, portanto, não foi meramente interrompido pela autora, mas sim marcado por uma inaptidão da clínica em entregar o resultado contratado.
Corroboram essa conclusão as diversas conversas via aplicativo de mensagens (evento 1, documento 10), que demonstram a persistente busca da consumidora por uma solução. Em 25/01/2024, a autora já manifestava sua insatisfação e a intenção de rescindir o contrato caso o problema não fosse resolvido, ao afirmar: "Fala pra ele dar um jeito pois ele sabe bem o transtorno que já deu essas próteses, caso contrário não quero mais saber dessa correria e quero meu dinheiro de volta" (evento 1, documento 10, página 5).
Posteriormente, em 9/2/2024, a autora solicitou formalmente a suspensão das cobranças e, em 19/3/2024 e 11/4/2024, questionou a clínica sobre o documento de rescisão, que nunca lhe foi apresentado (evento 1, documento 10, página 6 e 7).
É verdade que o laudo odontológico de evento 1, documento 14, atesta que os dois implantes instalados se encontram em aspecto de normalidade. Contudo, os implantes (parafusos metálicos) são apenas uma etapa do tratamento. O objeto do contrato era a reabilitação oral completa, que necessariamente incluía a confecção e instalação das próteses sobre os implantes. Deixar a paciente com os pinos expostos, sem a conclusão do serviço, configura um adimplemento substancialmente imperfeito, que se equipara ao inadimplemento para fins de rescisão contratual, conforme o art. 475 do Código Civil.
Diante desse quadro, a decisão do juízo a quo de determinar a restituição parcial dos valores pagos mostra-se escorreita e razoável. O magistrado ponderou que parte do serviço (a cirurgia) foi executada, abatendo 50% do valor desembolsado pela autora e condenando a ré à devolução de R$ 1.570,00 (mil quinhentos e setenta reais). Tal valoração está em conformidade com o princípio da reparação integral e veda o enriquecimento ilícito de ambas as partes.
Mantém-se, portanto, a condenação por danos materiais.
A apelante sustenta, ainda, a inexistência de dano moral indenizável, tratando o ocorrido como mero aborrecimento contratual, e, subsidiariamente, pleiteia a minoração do valor arbitrado.
Novamente, sem razão.
O dano moral configura-se pela lesão a direitos da personalidade, como a honra, a dignidade, a integridade psicofísica, entre outros, causando à vítima dor, sofrimento, angústia e humilhação que extrapolam os dissabores cotidianos.
No caso em tela, a situação vivenciada pela autora ultrapassa, em muito, o mero inadimplemento contratual. A consumidora não apenas teve frustrada sua legítima expectativa de concluir um tratamento de saúde bucal, mas foi submetida a um penoso processo que se arrastou por quase um ano. Foi exposta a procedimentos repetidos e malsucedidos (três moldagens fracassadas), teve de conviver com a ausência de dentes e com a presença de pinos metálicos em sua arcada dentária, com todas as implicações funcionais (dificuldade de mastigação), estéticas (prejuízo ao sorriso e à fala) e psicológicas (abalos à autoestima e à vida social).
A frustração de um tratamento odontológico que visa à reabilitação estética e funcional não pode ser relegada à categoria de simples aborrecimento. A angústia, a dor e a sensação de impotência decorrentes de tal falha são evidentes e prescindem de prova direta, configurando o chamado dano moral in re ipsa. A ofensa à integridade física e emocional da paciente justifica plenamente a indenização.
Quanto ao valor da indenização, a quantia de R$ 7.000,00 (sete mil reais) fixada pelo juízo de primeira instância mostra-se adequada e proporcional. Na fixação do quantum, devem-se observar os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, atendendo à dupla finalidade do instituto: a reparatória, para a vítima, e a pedagógico-punitiva, para o ofensor.
Considerando-se a extensão do dano, a conduta negligente da ré, a duração do sofrimento da autora e a capacidade econômica das partes, o valor arbitrado cumpre sua função sem gerar enriquecimento ilícito para a ofendida nem ser irrisório para a ofensora.
Portanto, a sentença deve ser mantida integralmente também neste ponto.
Honorários recursais
Em arremate, a sentença ora analisada e mantida por este e. Órgão fracionário, foi prolatada sob a égide do novo ordenamento processual civil, impondo o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, nos termos do art. 85, § 11, do Código de Processo Civil, obedecendo os requisitos pelo Superior Tribunal de Justiça no EDcl no AgInt no REsp. n. 1.573.573/RJ para seu arbitramento.
Dentro desse contexto, considerando os limites estabelecidos nos §§ 2º e 11 do artigo 85 do Código de Processo Civil e, considerando o valor atribuído à causa, o tempo decorrido para o trâmite do feito e atentando-se para os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade (CPC, art. 8º), majora-se os honorários advocatícios fixados na origem em R$ 1.000,00 (um mil reais) para R$ 1.500,00 (um mil e quinhentos reais).
Dentro desse contexto, considerando os limites estabelecidos nos §§ 2º e 11 do artigo 85 do Código de Processo Civil e, considerando o valor atribuído à causa, o tempo decorrido para o trâmite do feito e atentando-se para os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade (CPC, art. 8º), majora-se os honorários advocatícios fixados na origem em 12% (doze por cento) para 15% (quinze por cento) do valor atualizado da condenação.
Diante do exposto, conheço do recurso e nego-lhe provimento, com a fixação de honorários recursais.
Custas ex lege.
Publique-se. Intimem-se.
assinado por HAIDÉE DENISE GRIN, Desembargadora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7072802v2 e do código CRC 58025c5a.
Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): HAIDÉE DENISE GRIN
Data e Hora: 13/11/2025, às 17:07:02
5020701-57.2024.8.24.0018 7072802 .V2
Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 15:30:19.
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